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A bagunça da casa A poeira no chão  Caixas pesadas Restos de comida Um baseado pela metade A taça que continha vinho A vida virada  Revirada Virada de novo Será que assim volta pro mesmo lugar? Nada volta Não há volta Porque nada é igual ao que já foi A volta é uma ilusão  Para acalmar a ansiedade que sentimos de não sabermos de nada Cenas que parecem ser revividas Que carregam memórias  Que pensamos ter significado Não acontecem de novo O cenário parece, mas não é  Você é diferente Eu sou diferente A vida não volta A vida se assemelha A  bagunça  da casa -  organização   A  poeira  no chão -  limpeza   Caixas  pesadas  -  abertas Restos  de comida -  mesa farta Um baseado pela metade A taça  que continha  vinho -  repleta de A vida não volta A vida se assemelha

Viver

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Ela sabe que viver é para fora. Ela sabe que viver dá trabalho. Ela passou tanto tempo imersa em si que acreditou que isso era o viver. Vivia em seus pensamentos, vivia nos pensamentos dos outros, vivia histórias que não eram suas e pensava estar vivendo. E ela vivia. A profundidade de seus incômodos a envolvia em um vazio, fazendo-a sentir que lhe faltava uma parte de si mesma. Faltava o que? Indagava-se. Ela não sabia. O que tanto me falta? Perguntava-se com frequência. Faltava. Ela faltava. Tudo faltava. Mas ela vivia e acreditava que vivia. Viver dá trabalho. Viver dá muito trabalho. Ela não estava disposta a ter tanto trabalho. Ela estava exausta vivendo outras histórias. Outras dores. Outras necessidades. Outras demandas. Ela queria se livrar de tudo isso e ficar em profundo silêncio. Ela lia. Lia tanto que chegava a acreditar que sua vida era como a de cada personagem que conhecia. Ela queria ser todas essas personagens. Viver suas vidas, conhecer seus lugares. Sentir o que sent...

Joia rara e bruta

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Eu não sou material em decomposição. De onde ela tirou isso? Não gostei de ser comparado a um monte de matéria morta. Matéria fedida. Matéria pútrida. Ela está equivocada. Muito equivocada. Ela me ofende. Eu me sinto ofendido. Eu não sou material em decomposição. Eu sou joia rara e bruta. Sou joia rara e bruta. Problema dela se não enxerga. Problema dela se não sente. Problema dela se não me reconhece. Eu não sou material em decomposição. Nenhum verme vem me comer. Não me fundo a terra onde fungos me devoram e crescem e cogumelos gigantes se formam e alucinam aqueles que ousam me comer. É isso. Ela está alucinada. Ela me comeu e está alucinada. Ela comeu cogumelos. Ela está alucinada. Ela está alucinando. Ela está. Eu não. Eu não sou material em decomposição. Eu sou joia rara e bruta. Joia rara, bruta e que não quer ser lapidada. Quero ser encontrado. Quero ser descoberto. Eu já sei o que sou. Sou joia rara e bruta. Quer me encontrar? Eu quero ser encontrado. Quero ser visto. Quero ser...

Bailarina feliz

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Ela é um verme. Ele é um material em decomposição. Eles não sabem que isso é o que os conecta. Ela deseja ser uma borboleta. Ele deseja ser uma joia rara. Eles não sabem que isso é o que os conecta. Ela sente que tem algo errado entre eles, mas não consegue identificar. Cada vez que ele se mexe e exala um cheiro pútrido, ela se movimenta mais, contorce seu corpo cheio de ondas, anda sem saber onde fica o pé e a cabeça, abre sua boca enorme e começa a arrancar lentamente pedacinhos desse material mole e fedido. E ela chora. Ela come e ela chora. Ela sofre. Ela não quer ser um verme, mas o é. Não há pior sensação do que não se sentir o que é. Se olhar no espelho e não ver a realidade. Não pertencer. Mas ela o olha e enxerga uma joia rara sem lapidação e começa a come-lo ferozmente na tentativa de lapidá-lo. Ele não quer ser comido, devorado e nem ter seus pedaços arrancados. Ele não enxerga em si a necessidade de ser lapidado. Ele é joia rara e bruta e é isso que o faz se sentir pertence...

Ela pausa

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Ela. Sempre ela. Ela de novo. Ela novamente. Com suas inquietações e a mente agitada e flutuante e congestionada de quereres variados e repleto de cores e humores. Mas ela pausa. Ela pausa e quando pausa ela sente. E sente com tanta intensidade que o fluxo intenso de pensamentos vai abrindo espaço, andando lento e constante. Ela pausa e quando pausa ela sente. Sente o raiar do dia com sua luz a brilhar seu rosto com sono em direção ao sol. Sente o ar morno que toca sua pele ao abrir a porta e permitir que a maciez do ar acaricie sua pele sonolenta e desnuda. O ar quente percorre seu corpo por toda parte, como uma onda que eriça seus pelos e arrepia suas costas até a nuca. Ela se deixa abraçar pelo ar morno por alguns segundos e sente. Sente prazer. Sente vida. Sente desejo. Ela deseja o mar. Ela e o mar. Ela sabe que o ar quente que entra pela porta é um convite para o mar. Ela se arruma, ela se ajeita e ela caminha. Ela está em pausa. Ela suspendeu sua vida e permite ser guiada pelo a...

Vai-e-vem

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Aqui tudo é úmido. Tudo molha. Não seca nunca. O ar é quente e úmido e fica quase impossível de eu não fazer alguma associação com o nosso feminino íntimo. Não é sobre sexo, é sobre a abertura e disponibilidade do corpo. Quente e úmido. Disponível para o coito. Disponível para o esperma. Disponível para a fecundação. Disponível para a geração. De um outro ser. De um outro corpo quente e úmido. Não necessariamente. Mesmo parada, meu corpo escorre. Uma gota percorre meu braço, meu antebraço, minha cintura e só encontra obstáculo no tecido do biquíni, um impedimento não previsto, que não deveria existir, mas está ali. O corpo da gente não foi feito para ter obstáculos. O corpo da gente foi feito para escorrer livremente, suar em todas as curvas, entranhas, buracos, depressões. O suor fluido, um líquido salgado e nutritivo que permite nosso equilíbrio com o ambiente. O suor que nos avisa: olha, seu corpo está esquentando acima do que deveria e por isso vamos deixar sair o excesso, vamos so...

Ela deseja

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Ela é difícil de amar. Ela é difícil de ser amada. Ela é complexa na mesma medida em que é simples. Quer muito e não quer nada. Muda de humor, de temperamento, de amor. Ela só quer a parte boa, foi o que disse. A parte boa? É o que sempre ouve em seguida. Sim! A parte boa. Para se viver a parte boa, não há motivos para esconder a parte menos boa. Simplesmente há como aprender a lidar com ambas. Cada um cuidar de suas partes de forma independente e unida. Quando um cuida de si e o outro cuida do outro, ambos cuidam de ambos. A matemática é simples. Para existir o nós é preciso que exista o eu e o você. E tudo isso o faz tão difícil de amar. E tão difícil de ser amada. Quem é que tem disposição para aprender a lidar consigo mesmo? Ela tem. Ela tem e muita. Diríamos que é o que ela mais tem feito desde o dia em que descobriu que não existia. Sabia que um dia ela descobriu que não existia? Pois bem, ela descobriu. E foi uma grande surpresa. Ela passou anos, muitos anos existindo para todo ...